quarta-feira, 3 de maio de 2017

Este sentido de ser alguém ainda está aí?

Esses encontros carregam sempre um novo perfume. Nós estamos tratando de algo sempre novo. A Verdade é algo assim. Eu tenho percebido o quanto tem sido difícil, para alguns, a compreensão direta da importância de um trabalho como este, a importância direta deste trabalho.
Por que nós temos esse jogo aqui? Por que nós temos essa brincadeira aqui? Esse jogo chamado Mestre e discípulo? Essa brincadeira chamada Mestre e discípulo? Nós podemos levantar milhares de argumentos, questionar isso de diversas formas, ter milhares de aproximações para investigarmos esse tema, que é essa necessidade (ou não) de um jogo como esse, de uma brincadeira como essa, onde temos a figura do Guru e a figura do discípulo, a figura do Mestre e a figura do devoto.
É natural que alguns professores, alguns, assim chamados, “gurus”, digam claramente que não há você, que você não é real, que esse aparente indivíduo presente não é real. Os verdadeiros Gurus também fazem o mesmo. Podemos tirar daí a ideia de que você não pode fazer nada para essa Realização, uma vez que você não é real. Então, não existe nada que esse aparente indivíduo, essa aparente pessoa, possa fazer por essa Realização, em direção a essa Realização. No entanto, nós precisamos investigar isso, porque a verdade é que, enquanto houver alguma forma de identificação com essa ilusão de um “indivíduo” aparente, a ilusão dessa “pessoa”, não há qualquer escolha a não ser a busca.
Porém, é comum você ouvir, também, que a busca não é real, uma vez que aquele que está na procura disso não é real. Mas eu quero que você olhe comigo o que vamos colocar. Se existe esse sentido de separação, esse sentido de um “eu” localizado dentro [do corpo], ou como esse corpo, então essa crença – que não é só uma crença, mas também um sentimento – estará, com certeza, ocultando essa Realidade. Então, reparem que é uma fala bem paradoxal. Enquanto houver esse sentido de um “eu”, localizado aqui no corpo, ou como o próprio corpo, essa crença, esse sentimento, estará ocultando a Verdade.
A verdade é que não há “alguém”, não há a “pessoa”, mas essa crença/sentimento dá existência a essa entidade ilusória. Então, não adianta simplesmente teorizar sobre isso. Toda essa fala tão comum, de que o guru não é necessário, porque não há discípulo, não há mestre e não há pessoa, está perfeitamente certa, mas não funciona. Ela está certa do ponto de vista do Guru, ou do ponto de vista Daquele que está fora da ilusão de ser uma “entidade”, de ser “alguém”, de estar presente no mundo, dentro do corpo ou como o corpo. Mas, se isso não é real, é apenas uma crença e, como uma crença, não funciona. É só mais uma teoria sobre a Verdade, mas não é a Verdade.
É aqui que entra esse jogo, onde a figura do Mestre e a figura do discípulo aparecem para aquele que ainda se vê sendo uma entidade separada. Aquele que se vê como uma entidade separada não pode lidar com a Verdade; pode, sim, lidar com as crenças. Em suas crenças, ele pode aceitar a Verdade do Guru ou a ilusão do guru; mas, em suas crenças, ele não pode deixar de aceitar a ilusão de ser “alguém”. A crença não tem qualquer liberdade, mas a vivência direta da Verdade tem Liberdade. Repito: a crença não tem qualquer liberdade.
É uma tremenda ilusão – a pior e mais funesta de todas as ilusões – tecer teorias sobre a liberdade ou a verdade no campo da mente, onde só há crenças, teorias, ideias, conceitos. A Verdade está além disso! A Realidade de nossa experiência direta, que não é uma experiência pessoal, é a experiência sem o experimentador, sem a crença de um “eu” presente; a experiência livre da ideia “eu sou o corpo”. Essa experiência, o experienciar direto, é de uma ilimitada Consciência, suprema Inteligência, suprema Realidade. Mas isso não é uma crença, não é uma teoria. Portanto, a necessidade da brincadeira “Mestre e discípulo” sempre se fará necessária, enquanto a ilusão “eu sou o corpo”, ou “eu sou alguém”, estiver presente. É exatamente a crença “eu sou o corpo” ou “eu sou alguém” que está ocultando a sua Verdadeira Natureza, sua Real Natureza, Aquilo que é a Verdade sobre Você. Isso está ocultando, aparentemente, mas de uma forma “bem real”, a Paz, a Liberdade, a Felicidade, que é algo inerente, inato, que é a Natureza do Ser.
Então, todas essas discussões são puramente intelectuais, algo completamente estúpido e inútil. Enquanto o sentido de separação estiver presente, enquanto a ilusão de um “eu” separado, de uma entidade nessa experiência “corpo-mente-mundo”, estiver presente, a presença da figura do Guru se fará necessária. Eu sei que isso é uma forte pancada, um golpe violentíssimo, na presunção, no orgulho, e na vaidade do “eu”, porque ele é profundamente arrogante, bastante autodidata, mas não pode sair do campo da egoidade, da dualidade, por maior que sejam os seus esforços. Isso porque todo trabalho no ego é o trabalho do ego, para o ego e pelo ego. Todo trabalho na mente é o trabalho da mente para a mente, pela mente, com a mente e não sai da mente.
Não há quantidade de argumentos, de declarações e de afirmações que possam mudar isso, porque isso é assim. Somente Deus reconhece Deus! Somente Consciência se revela como Consciência! A mente não chega lá. Nenhuma prática, técnica de meditação, nenhum tipo de sadhana, nada disso pode manifestar essa Realidade, porque Ela está fora do tempo. A sadhana até tem certo lugar, mas isso é muito primário, inicial. Mesmo uma sadhana real, aquela diante da figura, da Presença do Guru, também não representa nada decisivo.
Portanto, se esse sentido de separação está aí, a ilusão está aí, com toda a sua intelectualidade, capacidade de argumentar, contra-argumentar, explicar, ensinar, concluir, deduzir. Estamos dizendo que essa aparente entidade presente na busca dessa Realização, dessa Felicidade, é ela mesma o impedimento. Assim, essa aparente entidade presente de braços cruzados, falando de uma “não entidade”, de uma “não pessoa”, da ilusão do discípulo e do guru, também está na mesma condição.
A coisa é muito simples, muito básica. O Guru é uma necessidade enquanto a ilusão estiver presente, carregada desse sentido de separação. O Guru é uma necessidade, porque esta Presença é uma necessidade! Deus é a única necessidade, porque Ele é a única Realidade, a única Verdade! Tudo mais são crenças, conceitos, ideias, conclusões, opiniões espiritualistas, conclusões filosóficas, conclusões advaitas, ou neo-advaitas, e assim por diante. Em Satsang, estamos tratando do fim do sentido de separação, dessa ilusão de “alguém” localizado dentro do corpo, aqui, como este corpo; estamos tratando do fim dessa crença/sentimento. Tratamos da ilimitada Consciência, Daquilo que é a base de todas as aparições, de toda e qualquer experiência. É o final, o “cair” desse véu, que é o véu da separatividade, da dualidade, do sofrimento, da busca, da ilusão do “eu”.
É algo completamente ingênuo, tremendamente estúpido, essa aparente e ilusória entidade presente, essa “pessoa”, falar de uma “não pessoa” e que não há nada para ser feito. Tremenda, funesta e grande ilusão! Tendo compreendido isso, fica muito claro que essa aparente entidade ainda está em busca da felicidade e, ao mesmo tempo, dizendo que não há nada para ser feito. Como uma aparente entidade, ainda nessa ilusão de ser “alguém”, de ser uma “pessoa”, nega a necessidade de fazer alguma coisa, se ela ainda está em busca da felicidade, da paz, da liberdade e da verdade? É só uma crença. Essa aparente entidade, também, é só uma crença, e crê que não há nada que se possa fazer, mas, mesmo assim, continua na dualidade, na egoidade, no sentido de separação, na infelicidade, na busca da felicidade. Então, nunca mais discutam sobre isso, pois é muito estúpido, coisa de um ego muito grande. Deixem a mente em paz. Parem de perturbar a mente. Portanto, guardem muito bem isso, e nunca mais terão problemas com isso.
Vou terminar apenas repetindo isso: se existe esse sentido de separação, esse senso do “eu” localizado aqui, dentro do corpo, como esse corpo, então essa crença, esse sentimento, está ocultando a Realidade, a Verdade de Ser, a Verdade de Sat-Chit-Ananda, a Verdade da ilimitada Consciência. Se Isto está presente, dizer que não há nada para se fazer e, ao mesmo tempo, continuar buscando a Felicidade, a Paz, o Amor e a Liberdade, carregando esse sentido de desejo e medo, é bastante sem sentido, estúpido e ingênuo.
Ok, pessoal. Vamos ficar por aqui. Até o próximo encontro. Namastê.
*Transcrito de uma fala ocorrida em 18 de Novembro de 2016, num encontro aberto online.
Para informações sobre os encontros e instruções de como participar, clique aqui.

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