quarta-feira, 8 de março de 2017

O caminho da Autoinvestigação e da Devoção

Eu só conheço duas ferramentas que funcionam para o Despertar: a auto-observação – que é a investigação da natureza efêmera do ego, da natureza temporária, volúvel, do “eu” – e a devoção. Eu diria até que é curioso eu tratar dessa auto-observação, dessa investigação da natureza de maya, da ilusão, do ego, porque, particularmente, o elemento que mais predominou no trabalho aqui [nesse corpo-mente] foi a devoção. Eu nunca tive interesse em conhecer os aspectos teóricos e teológicos desse assunto. Nunca havia lido ou ouvido falar sobre isso, o que se mostrou de grande valor para mim, porque eu fui sempre pego de surpresa dentro desse processo, desse trabalho do Despertar, e foi assim até o final. O caminho mais direto para realizar isso é a completa confiança no Guru, é a maturidade de lidar com Deus na forma do Guru. Mas quando você tem isso, você não discute com o Guru, porque você não duvida dele. Você não o questiona, não questiona o amor Dele por você. Eu já peguei vários de vocês discutindo comigo. Então, tem que ser pelo caminho da autoinvestigação mesmo.
O caminho da autoinvestigação é aquele caminho da desconfiança, da dúvida, do medo da rendição, da teimosia, do intelecto. O caminho da devoção é o caminho do coração, da rendição, da não dúvida, da certeza de estar diante do Sagrado. Um caminho assim é ingênuo, sem dúvida. Lembra a criança que, até uma certa idade, confia muito no pai e na mãe. Então, essa coisa de lidar com o Guru deve ser uma coisa assim para o devoto. O não devoto, aquele discípulo mais “cabeção” [que tenta capturar isso com o intelecto], fica dizendo: “Será que eu vou? Será que não vou? Será que é? Será que não é? Será que dá para confiar? Será que não dá?” Aí discute com o Guru. O caminho da devoção é muito mais direto, mas é muito mais arriscado, pode até resultar em morte, morte rápida [do ego]. O meu caminho com o meu Mestre não teve muitos atropelos, mas se esse código de confiança é rompido, essa senha é quebrada, aí não há mais como ter acesso.
A autoinvestigação é uma coisa muito árida, muito seca, muito impessoal. É uma bela ferramenta! A devoção é uma coisa assim muito calorosa, muito pessoal, uma coisa mais íntima. Ramana chegou a dizer que o Sábio é o real devoto. Quem é Deus para você? Quem é essa Consciência? Quem é essa Presença? Quem é o Guru? Não me fale do ponto de vista teórico, verbal, intelectual, expressando conceitos advaitas. Ramana era um exemplo claro de Sábio (Jnani) e de devoto.
[O mestre passa a ler a transcrição de uma fala de Robert Adams].
“Ramana Maharshi sempre disse que devoção, fé e autoinvestigação são a mesma coisa. Você não pode apenas ter a autoinvestigação seca, você tem que sentir o amor, você tem que sentir devoção, você tem que colocar Deus em primeiro lugar.
A menos que você ponha Deus em primeiro lugar, você vai ter apenas palavras secas, e as palavras lhe darão um intelecto afiado. Você será capaz de recitar todos os tipos de coisas, memorizar livros, ouvir palestras e se lembrar disso, mas você nunca vai realmente despertar. É por isso que às vezes Advaita Vedanta pode ser perigoso para algumas pessoas. No entanto, se elas realmente lerem os livros sobre Advaita Vedanta, elas vão entender que têm de desenvolver uma tremenda fé.
Pense em alguns dos professores que você conhece ou ouviu falar. Nisargadatta... Ele sempre orava. Ele percebeu que era Consciência. Ele se autorrealizou, mas ao mesmo tempo cantava, orava, tinha devoção. Parece uma contradição, pois você pode dizer: ‘Se alguém se autorrealiza e sabe que é tudo o que existe, a quem ele reza?’ Tente lembrar que toda a vida espiritual é uma contradição. É uma contradição porque as palavras não podem explicá-la. Mesmo quando você é o Ser, você pode orar para o Ser, que é você.
Ramana Maharshi sempre cantava no ashram, orações, cânticos devocionais. Essas coisas são muito importantes. Muitos ocidentais, que professam ser ateus, vêm para ouvir palestras sobre Advaita Vedanta, e nada ainda acontece em suas vidas. Enquanto você não tiver devoção, fé, amor, discernimento, desapego, será muito difícil despertar” [Robert Adams].
Robert Adams despertou com quatorze anos de idade, fazendo uma prova de matemática numa sala de aula. Quando ele era um bebê, ele via um pigmeu em seu berço. Quando ele cresceu um pouco mais, encontrou um livro na estante de uma livraria e reconheceu o pigmeu que ficava falando com ele no berço. Aquele pigmeu falou com ele até os sete anos de idade e, naquele momento, ele viu a foto dele no livro. Olha o pigmeu que apareceu para ele desde bebê e “trabalhou” com ele até os sete anos [o Mestre aponta para a foto de Ramana Maharshi].
Depois dos 14 anos, Robert Adams foi ver Joel Goldsmith, que o mandou para Yogananda. Ao se encontrar com Yogananda, este lhe disse: “Eu não sou o seu Guru. Vá atrás do seu Guru, ele está na Índia”. Então, com dezoito anos de idade, ele foi para a Índia, e ficou três anos com Ramana. Nos últimos três anos de vida de Ramana, ele estava aos seus pés.
Aprender com o Guru a cantar, a orar, a fazer puja, a entregar a sua vida a ele, a Deus, é uma ótima ferramenta. Robert Adams, quando não tinha músicos, colocava discos de devoção numa vitrola. Um dia perguntaram: “Por que você sempre coloca essas músicas para a gente ouvir?” Ele respondeu: “Vocês precisam ouvir essas músicas. Vocês são muito secos, precisam se molhar um pouco mais”. E continuou dizendo: “Quando uma semente está na terra, ela não brota, não germina. A terra tem que estar úmida. É preciso molhar a terra. O coração de vocês é assim. Vocês são muito secos, uma terra árida. Nenhuma semente pode germinar aí. Então, eu quero que vocês aprendam a orar e a cantar”.
*Transcrito de uma fala ocorrida no retiro de Réveillon 2016-2017, na cidade de Campos do Jordão/SP.
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